Arte em código aberto
CULTURA E PENSAMENTO ARTE EM CÓDIGO ABERTO: TECNOLOGIAS
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Arte em código aberto: tecnologias livres para música visual suscitam debates sobre independência e criação
Revista Coquetel Moltov no. 5, Recife – PE
Por Ana Lira
Quando perguntamos o que as pessoas compreendem por música visual, as duas primeiras respostas são: videoclipe, no formato exibido e popularizado pela Mtv, e as imagens selecionadas e projetadas em telão durante os shows que ocorrem mundo afora. O conceito de música visual,como um processo que une música e imagem em um único produto, é algo relativamente novo tanto para leigos quanto para uma parcela significativa dos que trabalham com criação e produção nas duas áreas; de modo que se faz necessário a discutir e divulgar os projetos desenvolvidos ao redor do mundo por “artistas-pesquisadores”.
Em Pernambuco, a necessidade de aprofundar a discussão caminhava junto com a disseminação de experiências como as do coletivo MediaSana, que integra música e informação visual em um forte debate sobre comunicação e cidadania. Desse modo, quando a programação do RedBull Music Academy resolveu trazer o workshop Novos Instrumentos Digitais com Tecnologia Livre e focar na produção de música visual,as comunidades especializadas em projetos de código aberto se movimentaram para garantir que novas sementes de diálogo fossem plantadas durante o encontro.
É que, ao contrário do que ocorre em ambientes que defendem o controle privado do conhecimento e da informação, o objetivo de pesquisadorese comunidades colaborativas envolvidos na criação desses projetos de código aberto é liberar artistas e produtores para adaptar as ferramentas às suas necessidades de criação. Isso pode ser feito pelo próprio artista, se ele tiver domínio das tecnologias, ou em parceria com os desenvolvedores dos softwares ou hardwares, a exemplo do ViMUS, criado por Jarbas Jácome; do LiVes, elaborado por Gabriel “Salsaman”Finch; e do Eletroacunpuntura, mostrado no workshop por José Balbino e Ricardo Brazileiro.
A boa surpresa desse movimento é que as iniciativas estão indo além dos softwares. A Eletroacunpuntura, que Balbino e Brazileiro trouxeram para o encontro, é um exemplo de controlador criado a partir de um equipamento de som encontrado no lixo. Eles estudaram a estrutura eletrônica da caixa e elaboraram um objeto similar aos samplers, que pode ser aliado a instrumentos musicais, sistemas de som, webcams, hardwares esoftwares de programação gráfica para produzir performances de música visual. Nesse projeto, em específico, eles estão utilizando o Pure Data e o Arduino. O objetivo da dupla é desenvolver melhor o equipamento e disseminar o processo de montagem para que artistas consigam utilizar a tecnologia em suas apresentações.
Essas iniciativas são bem vindas para quem deseja ter mais autonomia e custo baixo no processo criativo da música, da produção visual e da unificação entre as duas áreas. Elas seguem em uma via oposta ao pensamento dominante de que para ter tecnologia sofisticada e segura é preciso pagar caro. Quem ganha com isso, além dos artistas que estão no mercado, são aqueles que estão iniciando a carreira e não têm condições iniciais de investir uma soma avantajada de dinheiro na compra de equipamentos e programas. Muitos deles, inclusive, moram na periferia econômica do país e estariam ainda mais excluídos desse intercâmbio se não fossem as tecnologias de código aberto.
Neilton, guitarrista do grupo Devotos, dizia em uma das palestras do seminário Cultura Além do Digital, realizado em 2006, que eles estavam utilizando softwares livres e computadores com processadores Pentium e Pentium II para gravar os discos das bandas no Alto José do Pinho. Por outro lado, Spider, vocalista da banda Spider e a Incógnita Rap, contava na saída do workshop da Red Bull que essas tecnologias de código aberto deram um grande impulso ao potencial criativo dos jovens músicos e Djs do bairro de Peixinhos, em Olinda. Ele disse que o trabalho dos artistas mais experientes da comunidade, atualmente, é incentivar o uso dessas tecnologias aliado ao estudo da música e da produção visual, para que os novos grupos construam um trabalho mais consistente.
Esse panorama mostra que a discussão levantada no workshop, no Recife, não era apenas necessária, mas urgente, e que o diálogo aberto entre os desenvolvedores e o público precisa ser ampliado nesses e em outros locais em que a produção de música e conteúdo multimídia está crescendo com o uso de tecnologias livres. Isso é importante porque nem todos os artistas poderão participar do encontro anual promovido pela RedBull Music Academy, mas é possível partir desses pequenos espaços de discussão e criar núcleos de produção e difusão de informação cultural. É assim que as redes colaborativas funcionam e é por isso que elas têm transformado as relações de diversos setores da sociedade.
PARA SABER MAIS:
ViMus – https://jarbasjacome.wordpress.com/vimus
LiVES (em inglês) – http://lives.sourceforge.net/
Arduino – http://www.arduino.com.br/blog/
Pure Data – http://puredata.info
Estúdio Livre – www.estudiolivre.org
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